sábado, 30 de julho de 2011

Coisas urgentes a fazer

Mandar arrumar o telefone que estragou em janeiro;

Aceitar que algumas pessoas simplesmente não se importam;

Contar aos que se importam como são especiais;

Comprar o presente de aniversário que prometi entregar depois;

Terminar as monografias das últimas duas pós-graduações;

Terminar as relações com quem é fútil e vazio;

Fazer unhas;

Assistir aos últimos três filmes que estrearam;

Parar de pensar em como seria o futuro se...;

Ler os doze livros que estão na estante "livros para ler";

Parar de poupar o mundo de mim;

Poupar o planeta de mim;

Emagrecer os malditos e eternos dois quilinhos.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Fulana

"Quero ser sua amiga". A singeleza de Claudinha diante da minha negligência e apatia foi uma máquina do tempo. Retornei ao ano de 1991, quando mudei de escola. Momento assustador na vida de uma criatura de onze anos.

Uma das primeiras amigas que fiz era uma chata. Amiga do tipo “ainda-não-tenho-personalidade-suficiente-para-passar-o-recreio-sozinha”. Ela logo me avisou: não fale com a Fulana. Fulana não presta. Não admito apontar de dedos. Quem que na pré-adolescência não acatou avisos como esse sem questionar que atire a primeira pedra. Fulana virou persona non grata para mim.

Mas não demorou para me enturmar. Aos poucos, notei que meus coleguinhas nutriam uma curiosidade por mim. Eu era a novidade. Resolvi abusar da fama repentina e dei uma festa. Tema-auge da novela das oito, a festa era cigana. As meninas de saiões e brincos dançavam Please Don´t Go em uma pista com gelo seco e iluminada pela sequencia de luzes azul, verde, vermelho e amarelo (agora bati fundo na memória afetiva). Fulana não foi convidada.

Passado um tempo, estou indo embora pra casa e sinto um cutucão. Uma cartinha é estranhamente jogada em minhas mãos por um remetente apressado. Espanto. A despeito de minha grosseria, Fulana, em versinhos rimados, me dizia delicadamente “quero ser sua amiga”. Ali começava uma das relações mais profundas, fraternais e significativas da minha vida.

Da amiga chata, nunca mais ouvi falar.

Naninha, amo você infinito.
Claudinha, também quero ser sua amiga.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Quero

Quero o bem e o mal,
o melhor e o pior,
a beleza e a feiúra,
o engano e o esclarecimento,
a fúria e a candura,
o seco e o molhado,
o cheio e o vazio,
o recato e a luxúria,
a ignorância e o conhecimento,
o desconforto e o aconchego.

Quero inteiro.

Reação

Exército da morte.
Mercenários.
Torturadores sanguinários.

Quem paga os seus salários?

Pra preto e pobre, cassetete.
Sai fora pivete!

Nem todos são maus (é o discurso do jornal).
Mas o mal também reside no calar.
Não reagir e aceitar.
E a desculpa, pra variar?
Tenho meus filhos pra alimentar.

Também os tem aqueles que apanham.
Humilhados e destroçados.
Exterminados e desgraçados!

Impacientemente espero.
A hora de vocês irá chegar.
Quero ser a primeira a gritar.
De dentro de mim sairá um urro reprimido e profundo:
MÃO NA CABEÇA VAGABUNDO!

Leia: O que não vaza é pele

Quero te ver

Daqui a pouco te reencontro. Quero te ver depois, já no fim do túnel. Já cicatrizado da travessia. Já sem feridas expostas. Sem fadiga. Quero te ver pulando, de braços e mente abertos, feliz por me reencontrar. Quero te ver despido das perguntas, do medo e da insegurança. Quero te ver com a cara de quem conseguiu. De quem descobriu que não foi tão ruim quanto parecia. Quero te ver quando já não precisar desse encontro. Quando nós dois formos retratos, lembranças e boas risadas. Quando a nostalgia não causar dor. Quero te ver seu. E se diante desse desenlace fisgar em meu peito uma pontinha de angústia, saberei disfarçar. Também irei sorrir para você.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Separação

Separar é uma merda. Qualquer separação é ruim, mesmo quando é boa. Começa no nascimento o nosso medo de mudar, quando cortam o cordão umbilical e somos obrigados, ainda enrugados, ainda molhados, ainda sem consciência de nada, a encarar a nossa primeira separação. Quando inventarem a tecla SAP para recém-nascidos, entenderemos que o choro estridente que faz o médico acreditar que está tudo bem é, na verdade, um desesperado apelo: “me coloquem lá de volta. Lá é quente, é macio, tem comida. Lá eu já conheço. Com lá eu estou acostumado. Lá é aconchego e lá eu sou amado. Voltem comigo pra lá e fechem essa porra!”. Vamos conversar com os recém-nascidos, tentar convencê-los: “mas você tem o mundo inteiro pela frente. Se você voltar pra lá, não vai conhecer Paris, não vai nadar na cachoeira, nunca vai andar de patins e nem assistir a um filme”. Ele nos olhará intrigado e dirá: “tudo bem. Prefiro o que já conheço”. Pobre criatura humana sem escolha. Não anda, não fala, não tem cabelo, mas já tem que lhe sobrar coragem.

E essa brutal experiência de boas-vindas é apenas a primeira de muitas separações a que somos submetidos. Depois, separamos do bico, da bicicleta com rodinhas, do pai na porta da escola, da escola, dos amigos que vão, da faculdade, da vida sem obrigações, daqueles que morrem, da casa dos pais e, é claro, a dor-mor de todas as separações vivenciadas: dos amores. Como quase toda despedida, nessa vem o pacote do adeus à pessoa, que porventura ainda amamos, à história, aos hábitos, ao conforto, ao conhecido. Separar de um amor, no entanto, seja ele namorado, marido ou amante, tem suas peculiaridades. É uma despedida também dos planos que traçamos. Com algumas frases mal ensaiadas, apagamos o presente e partimos para reiventar o futuro. Sozinhos, sem garantias de compensação ou de sucesso, às vezes, um pouco aliviados, invariavelmente apavorados, partimos rumo ao total e absoluto desconhecido. Pode ser transformador, pode ser promessa, pode ser recomeço, mas é violência e flagelo em estado puro.

Dizem existir luz no fim do túnel mesmo nas mais amargas separações. Não há como negar, porém, que alguns túneis são, incrivelmente, mais compridos que outros.

Nós dois

Eu e o mundo. Dois estranhos. Não pertenço a ele. Ele não me pertence. Aqui, definitivamente, não é o meu lugar. Para os que amo, sou inimigo. Para meus inimigos, não sou ninguém. Louca a bradar bandeiras de lutas vãs. Tenho asco do mundo e da gente que nele se encaixa. Quero os malditos, os insanos, os desgraçados, os abandonados. Quero os que vagam, apanham e sentem frio. Quero os sem nome, sem mãe, sem dignidade. Quero a margem, o gueto, o nada. Mas desisto. Quero, mas não consigo mais. Abro mão. Desço. Vou embora. Aos guerreiros, deixo a espada. Sou covarde. Não quero mais. Desisto do mundo. Desisto do Homem.